A seis meses do final do mandato de Jair Bolsonaro (PL) como presidente da República, os brasileiros já convivem com as mazelas da enorme herança maldita que sua gestão vai deixar, além da reforma da Previdência, que acabou com o sonho de milhares de trabalhadores de um dia se aposentar.
O legado do governo Bolsonaro para a população é a volta da fome, mais pobreza e a maior queda de renda desde 2012, quando o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) passou realizar a pesquisa “Rendimento de Todas as Fontes”.
Em 2012 a renda média dos brasileiros era de R$ 1.454. No ano passado caiu para R$ 1.353 (menos 4,5%), atingindo principalmente os trabalhadores e trabalhadoras mais pobres, que sentem mais o peso da inflação e do desemprego sobre os seus rendimentos.
De acordo com a pesquisa, todos que se encontram entre os 50% mais pobres tiveram queda de rendimento, mas quanto mais pobre maior a queda.
– grupo dos 5% mais pobres = queda de 33,9%;
– grupo entre os 5% e 10% mais pobres = queda de 31,8%;
– grupo entre os 10% a 20% mais pobres= queda de 19,7%;
– grupo entre os 20% a 30% mais pobres = queda de 16%.
Para os grupos de maior renda, a perda anual foi menor.
– grupo entre 50% e 60% com maior rendimento = queda de 9%;
– grupo dos 1% mais ricos = queda de 6,4%.
Diferente do governo Bolsonaro, que reduz o papel do Estado e deixa um legado de mais miséria, os governos do PT fortaleceram o papel do Estado e deixaram um legado de prosperidade, emprego decente e milhões de pessoas ascendo das classes D para a C e da C para a B, acabaram com a fome e aqueceram a economia.
“A concepção dominante no país de que sem o Estado, com o mercado privado atuando haveria mais emprego, mais renda e menor inflação, se mostrou totalmente ineficaz”, afirma o economista o economista Marcio Pochmann.
As tragédias provocadas pelo desemprego que atinge 11 milhões de pessoas, pela fome que aflinge 33 milhões de brasileiros, pela inflação alta e queda brutal de renda poderiam ter sido evitadas se o governo Bolsonaro não rezasse pela cartilha enganosa de que o Estado é o maior responsável pela corrupção, que gasta mal e, portanto, justificaria a superação dos problemas que o país passa ao retirar os investimentos públicos, acredita Marcio Pochmann.
Para o economista, os fatores mais determinantes da herança que o governo Bolsonaro deixará e que precisam ser revistos são a política Preço de Paridade de Importação (PPI) da Petrobras, que alimenta a inflação, o fim da política de estoques agrícolas que mantinham equilibrados os preços dos alimentos, mesmo em época de entressafra e a volta do papel dos bancos públicos como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES), a Caixa Econômica Federal (CEF) e o Banco do Brasil (BB), que hoje atuam mais como um banco privados.
“Toda a compreensão dos governos petistas, do Estado ser um dos indutores da economia, dos bancos públicos ampliarem o crédito foi desmontado desde a ‘Ponte para o futuro’ do governo de Michel Temer, e foi aprofundada no governo Bolsonaro”, afirma o economista.
“O resultado foi o aumento do desemprego, da inflação e do empobrecimento dos brasileiros, pois o mercado privado foi incapaz, como já era esperado, de promover sozinho o crescimento econômico”, ressalta Pochmann.
A ”Ponte para o futuro” foi um documento lançado pelo MDB, partido de Temer, em 2015, que tratava de uma série de propostas econômicas e, que após o golpe de 2016 foram implantadas no país, mas até agora não resultou em nenhuma melhoria econômica.
Governos do PT mostraram que Estado pode ser indutor da economia
Segundo o economista Marcio Pochmann, o diagnóstico da economia nos governos do PT mostra que as ações em que o Estado era envolvido fazia parte da solução do problema, não era o centro do problema, como acredita a atual gestão.
“Vivemos numa economia capitalista, não há condições do Estado fazer tudo, mas ao realizar investimentos como o Minha Casa, Minha Vida, o Programa de Aceleração do Crescimento [PAC], entre outros, as gestões petistas estimularam as empresas a realizar grandes obras e a contratar mais trabalhadores. O governo investiu, mas quem ergueu moradias foram empresas privadas, o mesmo ocorreu com outras obras”, explica o economista. “O Estado teve um papel importante, mas não determinante, pois comandou a iniciativa de investimentos”, acrescenta.
“Com o desmonte dessa política, o setor privado fica sem rumo para investir e não faz isso por que não tem segurança do que vai ocorrer com a economia”, salienta Pochmann.
Perspectivas para o futuro
Para Marcio Pochmann a retomada da economia é possível com um novo governo, mas também a partir de uma base no Congresso Nacional que aprove as mudanças necessárias, além de considerar a situação internacional.
O economista vê com otimismo essa possibilidade. De acordo com ele, as dificuldades eram maiores há 20 anos, quando o Brasil dependia do mercado europeu e do norte-americano, mas com o crescimento dos países asiáticos, principalmente a China, abriu-se novas possibilidades de negócios com esses países.
Internamente, Pochmann avalia que é preciso recuperar a renda das famílias para ajudar a pôr um fim à a capacidade ociosa da indústria, movimentando assim a roda da economia pelo consumo. Para isso é preciso investimentos do Estado.
“Isso precisa estar associado a mudanças nas taxas de juros que hoje desestimulam o consumo e pesa mais sobre as famílias, cada vez mais endividadas”, diz.
Outra medida que havia sido utilizada pelos governos do PT e que se espera de um novo governo é uma política que garanta a estabilidade a médio e longo prazo da produção agrícola.
“Hoje só há estímulo para exportar, mas o governo atual esquece que o consumo interno é importante, e para isso é preciso estabilizar os preços, garantindo que eles não se alterem tanto. Claro que terão variação para cima ou para baixo, mas deveriam ser submetidos a parâmetros, sem retirar a liberdade do mercado, mas evitar oscilações com uma a política de preços mínimos, com crédito ampliado e segurança ao produtor. Isso é importante como política de combate à inflação”.
Metodologia da pesquisa
A pesquisa “Rendimento de Todas as Fontes” usa como metodologia o Gini –coeficiente de parâmetro internacional usado para medir a desigualdade de distribuição de renda entre os países.
O coeficiente varia entre 0 e 1, sendo que quanto mais próximo do zero menor é a desigualdade de renda num país, ou seja, melhor a distribuição de renda. Quanto mais próximo do um, maior a concentração de renda num país. O índice Gini é apresentado em pontos percentuais (coeficiente x 100).
No ano passado, o índice de Gini para renda domiciliar per capita no Brasil subiu para 0,544, ante 0,524 em 2020 e igual ao de 2019, ou seja, evidencia o aumento da desigualdade, no período.
Desigualdade por regiões
Todas as grandes regiões mostraram aumento de desigualdade de renda, na passagem de 2020 para 2021. No Norte, o indicador subiu de 0,495 para 0,528; no Nordeste aumentou de 0,526 para 0,556. No Centro-Oeste, avançou de 0,496 para 0,514 e, no Sudeste, passou de 0,517 para 0,533. Já na região Sul teve alta de 0,457 para 0,462.
Aumento da concentração de renda
No ano passado o rendimento médio do grupo do 1% mais ricos do país era 38,4 vezes maior que o rendimento médio dos 50% que ganham menos. Esse índice aumentou em relação a 2020, quando o rendimento médio mensal do estrato mais rico correspondia a 34,8 vezes o rendimento dos 50% com os menores rendimentos.
Fonte: CUT Brasil via CUTRS