O anúncio do fechamento da produção de automóveis pela multinacional Ford no Brasil, no último dia 11 de janeiro, e o descaso do governo Bolsonaro diante da grave situação, levaram os partidos de Oposição na Câmara dos Deputados, centrais sindicais, instituições e entidades do setor a se unirem em busca de solução.
O encontro ocorreu nesta quarta-feira (27), a partir da iniciativa dos deputados Carlos Zarattini (PT-SP) e Vicentinho (PT-SP). Os trabalhos foram coordenados pelos deputados Rogério Correia (PT-MG) e Vicentinho.
Ao se pronunciar, o líder da Bancada do Partido dos Trabalhadores na Câmara, deputado Enio Verri (PR), afirmou que essa ação da Ford é a “ponta do iceberg” que revela o processo de desindustrialização do País. Ele adiantou que ações judiciais e outras articulações conjuntas serão feitas para a manutenção da empresa no Brasil.
“Eu quero dizer que o debate que nós fazemos aqui sobre a Ford é a aponta do iceberg. Na verdade, aquela declaração do presidente Bolsonaro na semana passada, dizendo que o melhor caminho para o Brasil é não ter mais indústrias, defendendo o processo de desindustrialização, mostra a maneira como esse governo pensa o futuro do Brasil. Quando um governo defende uma proposta como essa, dá pra entender qual o futuro do Brasil e, principalmente, qual o futuro da classe trabalhadora”, criticou o líder Enio Verri.
Ao falar em nome dos líderes da Minoria na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), e no Congresso, deputado Carlos Zarattini, o líder da bancada petista disse também que o atual presidente da República “quer transformar o País numa grande fazenda, nos fazer voltar aos tempos do século dezessete, século dezoito, no mundo”.
Segundo Enio Verri, a luta em defesa da permanência da Ford no País, seja a partir de estatização ou nacionalização, para manter os empregos, os salários e os direitos dos trabalhadores é uma luta em defesa do Brasil. “Não é uma luta específica, não é uma luta pontual, é uma luta para quem defende um projeto de país mais justo, com emprego e salário digno a todos e todas”, explicou.
Perda de massa salarial e de tributos
O diretor do Dieese, Luís Paulo Bresciani, afirmou que as 5.000 demissões anunciadas pela Ford significam uma perda de mais de 118.864 mil postos de trabalho (diretos, indiretos e induzidos). Para ele, essas demissões podem resultar em perda potencial de massa salarial da ordem de R$ 2,5 bilhões/ano, considerando-se os empregos diretos e indiretos.
Bresciani alertou também que haverá queda de arrecadação de tributos e contribuições em torno de R$ 3 bilhões/ano. “O processo de desindustrialização tende a se agravar, caso esse processo não for interrompido rapidamente”, sentenciou.
O representante do Dieese classificou como “pífias”, as mobilizações industriais do governo. “No contexto da pandemia temos uma mobilização industrial zero. Não ouve esforço desse governo em mobilizar a indústria para o enfrentamento a crise. As inciativas tomadas foram absolutamente pífias” afirmou.
“Então, o fechamento da Ford é a ponta de um iceberg gigantesco e desastroso em que nós estamos colocados”, sentenciou Bresciani.
Decisão desrespeitosa e equivocada
No entendimento do presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM), Paulo Cayres, a Ford deveria devolver aos trabalhadores, em forma de benefícios, os incentivos governamentais que ela recebeu. Ele se referiu aos incentivos fiscais no valor de R$ 20 bilhões que a empresa vem recebendo desde 1999, segundo dados da Receita Federal.
“Sobre o fechamento da Ford, num primeiro momento, nós queríamos a ocupação da planta. Não deixar sair um parafuso sequer, porque isso é um desrespeito. Ela teve incentivos, como foi dito aí, nessa magnitude e simplesmente vira as costas e, na maior cara de pau, diz não para o Brasil, mas queria continuar vendendo os produtos aqui”, criticou Cayres.
Para ele, além de desrespeitosa, a atitude da Ford “é canalha”. Ele criticou ainda o fato de a multinacional tomar a decisão sem conversar com os trabalhadores e sindicatos.
“Na nossa visão, a Ford está querendo enfrentar a nova revolução industrial, fechando empresas e na nossa visão, como dirigentes sindicais, equivocadamente, até porque toda vez que não se ouve os dirigentes sindicais, não se senta na mesa, não se discute, é isso que acontece”, afirmou Cayres.
Faltou transparência
O representante do Ministério Público do Trabalho (MPT), Ronaldo Santos, criticou a falta de transparência. Segundo ele, todos foram pegos de surpresa. “Quando a gente fala de transparência, não ficou claro naquele momento, que era um processo maior. Pelo que me recordo, naquele momento, parecia que era só a desativação da planta de caminhões, como se a empresa fosse continuar”.
Santos alertou para a necessidade de dar uma atenção especial a esse processo. Segundo ele, a saída da Ford do Brasil não é só uma questão de “fechar as portas”, mas que é um processo que está ocorrendo no setor automotivo que pode ocasionar “uma desindustrialização grande”. Ele contou que o Ministério Público já pediu dados ao BNDES sobre a situação da Ford, e que está solicitando dados também para os governos estaduais.
“A transparência é muito importante, nós precisamos dos dados dos subsídios, das subvenções, e os compromissos da empresa Ford e de outras no Brasil. Nós precisamos de transparência, algo que é inevitável”, defendeu.
O representante do MPT sugeriu como encaminhamento que, a partir da audiência pública, se verifique a legislação que foi alterada em 2017. “Antes, para uma empresa conduzir veículos no Brasil ou importar veículos, ela tinha que ter uma planta industrial aqui e isso não precisa mais. Então, é um processo de desindustrialização, embora seja algo global, a política nacional, evidentemente, facilita”, esclareceu Ronaldo Santos.
Fonte: Agência PT via CUT RS